Por Gadeccartórios | Brasíl | 10 de maio de 2025
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) declarou nula a Resolução nº 27/2013, do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB), que promovia a reorganização de serviços notariais e de registro no estado, incluindo acumulações e desacumulações de atribuições em cartórios extrajudiciais. A decisão foi proferida pelo conselheiro Rodrigo Badaró, em julgamento conjunto do Pedido de Providências nº 0001147-90.2020.2.00.0000 e do Procedimento de Controle Administrativo nº 0002089-88.2021.2.00.0000, encerrado no último dia 8 de maio.
A deliberação do CNJ determina que a configuração das serventias nos municípios de Areia, Bananeiras, Caaporã e Cuité deve voltar ao formato anterior à edição da resolução. O julgamento é considerado paradigmático ao reafirmar que a criação, extinção ou alteração das atribuições dos cartórios exige lei formal, e não pode ser feita por mera resolução administrativa dos tribunais estaduais.
Reorganização de cartórios sem lei formal foi considerada inconstitucional
A Resolução nº 27/2013, editada pelo TJPB com base no artigo 290 da Lei Complementar Estadual nº 96/2010, estabelecia mudanças estruturais em diversas serventias extrajudiciais do estado, como a transferência de competências entre cartórios e a fragmentação ou acúmulo de atribuições. Entre os exemplos mais sensíveis está a serventia da comarca de Bananeiras, que teve suas funções alteradas após a aprovação no concurso de delegação, surpreendendo os candidatos com uma nova configuração funcional.
A legalidade da medida foi contestada inicialmente por candidatos aprovados no concurso público regido pelo Edital nº 1/2013. Eles alegaram que as alterações foram feitas sem respaldo legal e comprometeram a transparência e previsibilidade do certame. A questão chegou ao CNJ por meio dos dois processos administrativos, que foram unificados para julgamento conjunto, dada a similitude das matérias.
STF reforça competência do CNJ para controle de atos inconstitucionais
Na fundamentação da decisão, o conselheiro Rodrigo Badaró destacou que há jurisprudência firme do Supremo Tribunal Federal (STF) no sentido de que modificações em serventias extrajudiciais exigem lei em sentido formal. Foram citadas decisões em ações diretas de inconstitucionalidade (ADI 2.415/SP e ADI 4.140/GO), nas quais o Supremo reafirma que atos como criação, extinção, acumulação ou desacumulação de cartórios demandam iniciativa legislativa específica, ainda que a matéria trate de organização judiciária.
“Se esse feixe de competências públicas investe as serventias extrajudiciais em parcela do poder estatal, a modificação dessas competências somente pode ser feita por meio de lei formal, segundo a regra de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, pontuou Badaró, citando o voto do ministro Ayres Britto no julgamento da ADI 2.415.
A decisão do CNJ também foi respaldada por decisão da Primeira Turma do STF no Mandado de Segurança nº 38.172, impetrado por parte interessada na manutenção da Resolução. O Supremo negou provimento ao recurso, reafirmando a legitimidade da mudança de entendimento do CNJ e afastando a alegação de decadência administrativa diante da constatação de flagrante inconstitucionalidade.
Marco temporal de títulos no concurso foi mantido
Outro ponto abordado na decisão envolveu o prazo para aquisição de títulos no concurso de delegação de notas e registros públicos do TJPB. Os requerentes contestaram a republicação do Edital nº 2/2019, que teria flexibilizado a data-limite para obtenção de títulos acadêmicos e de experiência profissional, contrariando as regras previamente estabelecidas.
No entanto, o CNJ entendeu que a modificação foi legítima. Com base na Resolução CNJ nº 81/2009, o colegiado reconheceu a possibilidade de o tribunal fixar prazo distinto desde que fundado em critérios objetivos e aplicáveis a todos os candidatos. A alteração, segundo o relator, não configurou quebra de isonomia, tampouco afronta à legalidade ou à segurança jurídica, e serviu para dar concretude ao longo intervalo entre a publicação do edital e a fase de entrega dos títulos, ocorrida entre dezembro de 2019 e janeiro de 2020.
Repercussões e próximos passos
A decisão do CNJ impõe ao Tribunal de Justiça da Paraíba a obrigação de reorganizar, no prazo de 90 dias, as serventias afetadas de acordo com a configuração anterior à Resolução nº 27/2013. A exceção recai sobre serventias cujas vagas surgiram após a promulgação da Lei Estadual nº 12.511/2022, que poderá ser aplicada para futuras reorganizações, desde que respeitada a exigência de lei formal.
Especialistas em Direito Notarial e Registral avaliam que a decisão reforça os limites da autonomia administrativa dos tribunais, reiterando a necessidade de respeito ao devido processo legislativo. “Trata-se de uma sinalização clara do CNJ e do STF de que não cabe aos tribunais editar normas que afetem a estrutura de serviços públicos delegados sem base legal expressa”, afirma um professor de Direito Constitucional consultado pela reportagem.
Conclusão
O julgamento do CNJ sobre os procedimentos administrativos envolvendo a Resolução nº 27/2013 do TJ da Paraíba marca um ponto de inflexão na fiscalização da organização dos serviços extrajudiciais no Brasil. A reafirmação da obrigatoriedade de lei formal para mudanças estruturais em cartórios reforça a segurança jurídica e garante previsibilidade aos concursos públicos para outorga de delegações. Com essa decisão, o CNJ consolida seu papel como guardião da legalidade administrativa no âmbito do Poder Judiciário.
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